O jovem Antônio Felipe Teixeira Santana, 22 anos, era do corre. Até pouco mais de um ano, ganhava a vida dançando pagode. Mas com a pandemia, se virava como motoboy, já que os eventos foram suspensos.
Ele também foi soldado do Exército e é vice-campeão baiano de boxe na categoria galo. No auge da juventude, ele já tinha sido muita coisa, inclusive pai de uma menina de nove meses. Mas, hoje, ele virou estatística: é uma das 13 pessoas que foram assassinadas neste domingo (14), em Salvador e Região Metropolitana (RMS).
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Antônio Felipe tinha de entregar uma marmita numa casa por volta das 20h, na localidade da Georgina, na Boca do Rio, quando foi surpreendido por três bandidos armados. “Meu sobrinho era muito inteligente e não ficava parado. Jogava capoeira, foi dançarino, vice-campeão de boxe, serviu o Exército. Era um orgulho para nós”, lamentou o tio do rapaz, na manhã desta segunda-feira (15), no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues.
Segundo moradores, os criminosos que mataram o jovem eram o traficante Eronaldo dos Santos Ramos, conhecido como ”DVD”, que já comandou o tráfico na Georgina, e um outro rapaz apelidado de Marcelinho. Ambos são apontados como integrantes do Comando da Paz (CP), facção criminova que briga com a rival, Bonde do Maluco (BDM), para o controle do tráfico na Boca do Rio. Um terceiro participante seria um traficante da Engomadeira, cujo domínio também é do CP.
O caso está sendo apurado pela 1ª Delegacia de Homicídios (DH/Atlântico). De acordo com as informações iniciais da Polícia Civil, o crime realmente foi cometido por três homens, mas as identidades deles ainda não foram confirmadas pela investigação. “A motivação também não está definida. As oitivas devem ser agendadas, para que sejam coletadas as informações que possam contribuir com a linha de investigação. Nesse momento não temos mais detalhes”, disse através de nota oficial. Até o fechamento desta edição, ninguém foi preso.
Morto a tiros
O crime aconteceu na Rua Dário Valois, atrás de uma fábrica da gelo. Segundo parentes, Antônio Felipe desceu da moto para fazer uma entrega e entrou em uma rua, onde deixou a comida encomendada em uma casa. Ao retornar, quando ajustava a mochila de entrega na moto, surgiram três homens, que saíram de dentro de um carro. Logo em seguida, o motoboy foi baleado. O jovem chegou a ser socorrido para o Hospital Roberto Santos, no Cabula, mas não resistiu.
“A gente não sabe o que, de fato, aconteceu. A família está toda em estado de choque. O que temos a certeza é que meu primo não era vagabundo. A prova disso é que ele foi morto quando estava trabalhando. Foi mais um inocente vítima dessa violência desenfreada. O que a família toda quer é justiça”, declarou uma prima do rapaz, no IML.
Os parentes do jovem disseram que Antônio Felipe foi socorrido pela Polícia Militar. Em nota, a PM contou que uma guarnição do Pelotão de Emprego Tático Operacional (Peto) da 39ª Companhia Independente da PM (CIPM/Imbuí-Boca do Rio) realizava rondas na Boca do Rio, quando foi acionada pelo Centro Integrado de Comunicações da Secretaria de Segurança Pública com a informação de homens armados efetuando disparos de arma de fogo na Rua Dário Valois.
“Ao chegar ao local, um homem foi encontrado ferido. Os policiais militares prestaram socorro à vítima, encaminhada para o Hospital Roberto Santos (Cabula). Nenhum suspeito foi encontrado. A Polícia Civil investiga o fato”, diz a nota.
Investigação
Apesar de a Polícia Civil ainda não ter detalhes, moradores contam que os três traficantes atiraram em Antônio Felipe porque sabiam que ele morava na localidade do Barreiro, onde o tráfico é liderado pelo BDM.
“Eles estão fazendo isso direto. Saem de lá e vem para cá atrás dos desafetos deles. Quando não encontram ninguém que eles querem, acabam tirando a vida de inocentes. Foi o que o aconteceu com o rapaz. Estamos todos indignados”, disse um morador que preferiu não se identificar.
A morte do lutador de boxe e motoboy também foi lamentada pelos próprios integrantes do BDM da Georgina. Segundo eles, os rivais agiram “na covardia”. “Vocês só sabem fazer isso mesmo, matar alvo fácil e na covardia. Vermes! DVD, Marcelinho e outros”, dizia uma mensagem postada em um perfil de Instagram de um dos integrantes do BDM, ao qual o CORREIO teve acesso.
“Covardia desses caras, rapaz. Só matando gente inocente. O pivete se envolvia em que na guerra? Com o filho pouco tempo de nascido”, lamentou outra pessoa na postagem do perfil.
Dos ringues aos palcos
Antônio Felipe era cheio de talentos. Foi campeão vice-campeão baiano de boxe peso galo em 2015 e, há pouco mais de um ano, deixou o Exército Brasileiro, onde serviu como soldado. Desde então, passou a fazer o que mais amava: dançar. Ele entrou no grupo Tá Kebrando, que apresentava shows de pagode de Salvador, e também trabalhava como dançarino freelancer (profissional independente) para artistas baiano, como Mário Vítor, do Psirico.
“Duas horas antes, eu falei com ele. Estávamos programando uma viagem em família para a Chapada Diamantina. Ele também tinha acabado de receber uma proposta para trabalhar numa empresa em outro estado. Estava feliz” , contou o compadre da vítima.
Domingo foi sangrento
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, dos 13 casos de homicídios no domingo, três foram na RMS: Dias d’Àvila, Camaçari e Lauro de Freitas. Do total, oito corpos estavam identificados, ou pela polícia ou pelas famílias. Entre as vítimas assassinadas estão duas mulheres e um adolescente 17 anos.
Entre dos mortos está Genival da Paixão Santos, 37, assassinado a tiros, por volta das 15h. Ele estava dentro de casa, na Rua 21 de Abril, bairro de Garcia D’Ávila quando desconhecidos invadiram o imóvel.
O crime é investigado pela 25ª Delegacia (Dias D’Ávila). “Ainda não temos informações para passar. Estamos apurando. O nosso pessoal está no local fazendo um levantamento de tudo”, declarou o delegado Bruno Pereira Oliveira da Silva.
Além da Boca do Rio, Dias d’Avila, Camaçari e Lauro de Freitas, foram registrados homicídios em São Cristóvão, Marechal Rondon, Itapuã, Canabrava, Alto da Teresinha, AphaVille, Fazenda Grande do Retiro, Castelo Branco e Caminho das Árvores.
Fonte: Correio